O Estado das Coisas
O Estado das Coisas
Meu depoimento
Era época em que os jornais estavam censurados e não disfarçavam. Algum artigo mais contundente contra o regime militar, ou mesmo por simples implicância, era retirado por ordem do censor residente e, sob a alegação que a edição estava pronta, era substituido ora por mancha preta, ora por texto alternativo, pura gozação, como trechos de poesia clássica ou de receita culinária.
Via constantemente a artimanha e, sobre a primeira página do O Estado de São Paulo, diário muito combativo, registrei O Estado das Coisas. Alusão ao titulo daquele periódico, estado como unidade da federação, substituido por estado como sinônimo de condição.
Fiz 5 peças destas muito parecidas umas com as outras, alterada apenas a dancinha das letras ensacadas em transparências. Sempre achei que a passagem do olhar pelos saquinhos tranparentes daria alguma vida ao texto que não se lê.
O acaso fez com que duas delas se perdessem: estavam sendo preparadas para exposição no Museu de Arte Contemporênea da Universidade de São Paulo e quando o motorista do museu passou para pegá-las nem todas estavam secas. Fiquei de levar as duas últimas pessoalmente, mais tarde. Quando cheguei o painel expositivo já estava carregado e essas duas ficaram de fora. E se perderam.
As tres que foram expostas, não lembro por que trato, passaram para o acervo do Museu e lá estão até hoje.
Gabriel Borba 2019